terça-feira, 19 de agosto de 2014

Do teu medo

Meus movimentos precisos te envergonham
e você não percebe a tua risada gritada no ônibus

Você se mostra em todos os países do mundo, em todas as partes
mas se esconde em finais de junho

Meu beijo masculino te enrubesce
e teu coração para de bater por alguns minutos

a vergonha que você carrega ao lado desse medo infantil
te deixa vulnerável como numa canção feminina e...

... ainda assim você se silencia frente aos meus modos, minhas maneiras...

Não te peço voz
Mas saiba que teu silêncio me entristece

Saiba que a tua risada no ônibus te mantém vivo
em nome de todos aqueles que foram amarrados em postes e deixados para morrer

Cada abraço escondido
Cada beijo negado
Cada silêncio exigido
Cada palavra engolida

É um corpo – feminino ou masculino – morto
O teu silêncio carrega sangue.

O teu medo fortalece o punho do outro
Enfrente-se
Me enfrente

E, por fim,
saiba que todos sabem, mas se silenciam porque têm medo do que o teu medo é capaz.


segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Que...

Que o teu corpo nu me dá o direito de te violar
Que o teu copo cheio me dá o direito de te violar
Mas quando me violam me calo tanto quanto você porque não posso admitir que durante alguns minutos eternos fui como você

Que a tua roupa me dá o direito de te violar
Que a tua fala me dá o direito de te violar
Mas me calo frente a membros que me rasgam porque não consigo verbalizar a dor que me aproximou de ti

Que o teu medo me dá o direito de te violar
Que o teu sorriso me dá o direito de te violar
Mas apago da minha memória todas as mãos no meu corpo viciado em culpa porque eu nunca poderia dizer que fui como você

Que a tua sexualidade me dá o direito de te violar
Que a tua paz me dá o direito de te violar

Mas guardo um segredo no passado esquecido e na cicatriz da minha perna porque ninguém pode saber que durante aqueles malditos minutos alguém achou que era como você.

Das mãos

Hoje eu cortei as linhas das minhas mãos
Raspei os três calos em cada palma
Sangrei a pele grossa da ponta dos dedos, eliminei minha identidade.

Com o lápis deste texto marquei três círculos nas dobras do meu dedo que confirmam minha positividade
ou negatividade
ou imparcialidade.

Costurei minha ferida com o grafite.

Com as mãos em punho, não se vê nada
Só as marcas do cigarro nas articulações
Se você sabe ler as linhas,
eu abro minhas mãos e deixo seus dedos passarem pelas linhas que criei:

Há uma história ancestral que fui apagando com a ponta do lápis.
E há essa nova história que decide-se deixar que você me conte.

Seus dedos estão vermelhos do meu sangue.
Tire sua blusa e deixe que eu marque minhas mãos nos seus peitos.
Pronto. Agora você tem minhas duas histórias:
Ancestral e Primal,

porque é assim que sei contar minha(s) história(a):

De corpo para corpo.